segunda-feira, 29 de junho de 2020



O vento era forte, dentro e fora.
O vento dentro, o barulho interminável durante o dia e de noite a ressaca. 
Gosto do mar cinzento, frio e o céu selvagem. 
A água rasgada que atropela tudo na esperança que cada coisa volte ao lugar certo.

Sou mulher de mar de inverno. 
As praias sacudidas pelo vento e os cabelos nos olhos.
Sou mulher de águas frias para sentir a vida. 
Uma mulher de céus estrelados, os pés descalços e o vestido molhado. 
E a água salgada. Por dentro e por fora.
Havia a areia que marcava as pernas e a cara. 
O vento furioso que apertava o peito, a maré baixa e a espuma branca e fria.


Havia o vento. Deixei-o levar-me, cansada de resistir. 

quinta-feira, 25 de junho de 2020







Às vezes sou uma mulher imprópria. Fico perto demais, insisto sem pudor e vivo a audácia. Enfio as minhas palavras nos teus silêncios, como um suspiro entre as costelas, um murmúrio junto aos rins, uma explosão no caminho obscuro da raiva. 

Procuro o sentido, o fio do desejo ou a falha iminente.

domingo, 21 de junho de 2020




Há as que se preparam, silenciosas, espessas e pesadas, opacas.
 Chegam com um carinho matreiro e puxam-nos para o abismo obscuro.
Os movimentos desaceleram. É quase impossível mexer. 
Os pensamentos transformam-se em pântanos.

Há também as pacíficas, que levam e trazem. 
Empurram o suficiente para ajudar nos movimentos e para poder crescer. 
As que cantam, sopram e acalmam. 
As que vêm cobertas de espuma mas que permitem avançar, sem medo.
Depois há as loucas e inesperadas. 
Atropelam e mostram desejos escondidos. 

E depois de rebolar e cair, voltam as primeiras, sempre. 

As ondas.

terça-feira, 16 de junho de 2020



Todos conhecem músicas, livros ou pessoas capazes de viciar, 
daquelas que se esgueiram pelo meio dos pensamentos, impedindo qualquer concentração? 

Quem nunca sucumbiu a uma tentação? 
Daquelas tentações que atropelam sem avisar , cheias de indecência. 

Às vezes sou uma mulher imprópria, que insiste sem pudor. 
Enfio as minhas palavras nos silêncios, como um suspiro entre as costelas, 
um murmúrio junto aos rins, uma tumulto na fissura sombria da raiva. 
E aprendo a guardar as feridas. 

E então há que celebrar a alegria. Ela ilumina as cicatrizes. 
Rir para saborear, sorrir. Engolir os segundos felizes e frágeis. 
 O suor afoga-se nos lençóis e perfuma o quarto. 
Não existe mais nada além da urgência, do olhar que emociona.
Agarrar a força, tocar os sorrisos, lamber o sal junto aos lábios. 

Há momentos cheios de faíscas, quando se inventa um outro mundo.