as aparências enganam
aos que odeiam e aos que amam
porque o amor e o ódio se irmanam
na fogueira das paixões
os corações pegam fogo
e depois não há nada que os apague
se a combustão os persegue
as labaredas e as brasas são o alimento
o veneno e o pão
o vinho seco
a recordação
as aparências enganam
aos que odeiam e aos que amam
porque o amor e o ódio se irmanam
na geleira das paixões
os corações viram gelo
e depois não há nada que os degele
se a neve cobrindo a pele
vai esfriando por dentro o ser
não há mais tempo de se aquecer
não há mais tempo de se esquentar
não há mais nada pra se fazer
senão chorar sob o cobertor
as aparências enganam
aos que gelam e aos que inflamam
porque o fogo e o gelo se irmanam
no outono das paixões
os corações cortam lenha
e depois se preparam para outro inverno
mas o verão que os unira
ainda vive e transpira
ali nos corpos junto à lareira
na reticente primavera
no insistente perfume
de alguma coisa chamada
amor
Elis Regina